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Salvador, Bahia, Brazil
Este blog contempla as experiências dos alunos do 1º semestre do curso de comunicação da Faculdade da Cidade do Salvador(FCS) - Jornalismo e Publicidade para a disciplina Trabalho Interdisciplinar Dirigido (TID). Com a temática "Autores Brasileiros" a equipe formada pelos alunos: Amanda Soriano, Daniela Mattos, Greicehelen Santana, Larissa Pamponet, Vanessa Fontes, Zaidan Torres e Zaira Aragão, escolheu trabalhar as crônicas da escritora Lya Luft. A professora responsável pela disciplina, é a jornalista Nadya Argôlo.

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Demasia


Os filhos que pari trilharam seus caminhos (como dizem que deve ser). Eu não me conformei:andei em seus calcanhares, lancei-me em mil direções,fiquei perdida nesta casa vazia. Toda a noite espreito os velhos quartos para ver se as memórias dormem direito, se escovaram os dentes,fizeram as lições. Meus filhos tiveram outros, e eu me fragmentei ainda mais. No espelho não vejo ninguém: virei poeira de gente,soprada entre eles. Tanto me entranhei em suas ivdas, que tentam limpar-se de mim para poderem crescer,para não serem meus filhos. 

Se Quiserem Me Amar



Se me quiserem amar, terá de ser agora: depois, estarei cansada. Minha vida foi feita de parceria com a morte: pertenço um pouco a cada uma, para mim sobrou quase nada. Ponho a máscara do dia, um rosto cômodo e fixo: assim garanto a minha sobrevida. Se me quiserem amar, terá de ser hoje: amanhã, estarei mudada. 

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Em quem Confiar




Ando carente de confiança. Andamos, eu acho. Em quem acreditar, em quem confiar, em quem apostar, a quem eleger. por exemplo? Não sei se em outros tempos a gente confiava mais nas pessoas e nas instituições, e detesto saudosismo, mas penso que sim. Porque éramos simplórios? Pode ser. Hoje talvez sejamos mais espertos, criancinhas conhecem mundos, belezas e maldades que a gente só conhecia depois de casado... E olhe lá.
As instituições pareciam sólidas, Judiciário, polícia e política. Lembro-me do chanceler Oswaldo Aranha, que raro jovem hoje saberá quem foi, mas que teve papel importantíssimo no Brasil e no mundo ocidental, amigo de juventude de meu pai, me pegando no colo, em nossa casa, e profetizando, para meu azar: "Você tem olhos lindos, mas precisa se cuidar ou vai ser gordinha". Lembro o aroma de seu charuto, as cores de sua gravata, a voz profunda, o riso bom, e sua naturalidade em nossa casa que estava longe de ser uma mansão.
"Não dá para arrumar tudo. Mas tem de melhorar, para que a gente durma e acorde ao menos com a sensação de que em algumas pessoas e instituições ainda se pode confiar!"
Quando a professora ou professor entrava em sala de aula, a gente se levantava - isso até o fim do 2° grau -, e não faz um século ainda. Hoje batem nas professoras, jogam objetos, falam alto com o colega ou ao celular, se possível, ameaçam ou ridicularizam. Nem todos nem em toda parte, essa ressalva se faça sempre nos meus textos. Mas são coisas que há alguns anos nem passavam pelas nossas fantasias de adolescentes, naturalmente - e necessariamente irreverentes, numa irreverência que hoje deve parecer patetice. A gente era amigo dos filhos do juiz da cidadezinha, e achava o máximo. O pastor de nossa comunidade luterana era recebido em casa com respeito, mesmo que não fôssemos praticantes de religião alguma. Para meu pai, Deus estava em toda parte, na natureza, no outro, em nós mesmos, fator essencial da nossa dignidade, e do sagrado de tudo.
[...]
Acho que tudo vai ficando chato e cansativo: esperança de um lado, desgosto de outro, bom modelo aqui, corrupto mandando ali. Não dá para arrumar tudo. Nem rei, nem papa, nem o maior guerreiro do mundo antigo ou do atual mundo virtual, nem o mais hábil dos bruxos divertidos ou sinistros, mudaria a face do país com um golpe de espada ou caneta. Mas que tem de melhorar, ah, isso tem, para que a gente durma e acorde ao menos com a sensação de que, sim, em algumas pessoas, algumas instituições e algumas coisas ainda se pode confiar.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Canção do Amor Sereno




segunda-feira, 27 de maio de 2013

Casulo








Lembro-me de ti
Nesse instante absoluto,
A vida conduzida por um fio de música.
Intenso e delicado, ele vai-nos fechando num casulo
Onde tudo será permitido.

Se é só isso que podemos ter,
Que seja forte. Que seja único.
Tão íntimo quanto ouvirmos a mesma melodia,
Tendo o mesmo - esplêndido - pensamento.

Lya Luft

Corda Bamba



Corda bamba que eu empenho minhas paixões inúteis de louca, trapezista ou palhaça, levando no chapéu torto a flor da esperança de que tenham esquecido as redes. Não importa saber: abaixo dessa dança, no vazio que finges, sei que observas. Teu rosto de disfarçado amor espelha tudo o que sonho, escondo ou faço.

sábado, 25 de maio de 2013

OS QUE NÃO VOTARAM


As notícias de todos os lados me dizem que o número de brasileiros que não votaram, isto é, abstenções ou votos nulos, cresceu grandemente, chegando a mais de 25% dos eleitores.
Nestes dias tumultuados de novidades — com a atenção daqueles que pensam e observam presa no Supremo, que salva algo da nossa moral e dignidade, ou com um brevíssimo espreitar no segundo turno das eleições, com seu jogo nada original de busca pelo poder —, fiquei refletindo sobre a razão dessa abstenção, pois a votação é obrigatória, coisa que, aliás, considero erro e atraso.
Se não tivermos liberdade de eleger nossos líderes, representantes, governantes, não deveriam nos forçar, ou recorreremos à abstenção.
Afinal, quem é quem, nessa sopa de letrinhas, quem tem quais projetos, que linha, que espinha dorsal, que conduta e quais propostas são originais, reais e vão ser executadas?Quanto a ela, vejo dois motivos possíveis. Primeiro, descrença e desalento. A proliferação de partidos e o troca-troca de legendas, além das fusões, alianças e conluios, nos desorientam e desestimulam.
Os inimigos figadais aqui e ali dançam um minueto, antigos aliados hoje cruzam punhais em duelos estranhos ou cômicos, figuras inusitadas ou velhíssimos figurões desfilam, mas a gente não sabe direito a que vieram ou como voltaram aos palcos.
Em segundo lugar, talvez falte interesse em saber, em deslindar, em escolher e decidir. Ou melhor, os interesses e as seduções são outros.
Não nos abalam corrupção, falta de ética, despreparo, improvisações, o extraordinário nivelamento por baixo a corroer nossas universidades, agora com aumento das cotas, que nos farão descer ainda mais na posição entre as piores do mundo.
Muito mais do que melhorar o país, queremos consumir. Estamos pouco exigentes: com crédito alargado, queremos comprar.
Podemos e devemos consumir, nos dizem de muitos modos, podemos comprar qualquer coisa quase a perder de vista (grave engano). Comprar é muito mais divertido do que observar, analisar, escolher e, por exemplo, votar nas eleições.
Tanta coisa original correndo por aí, como, por exemplo, meninas que vendem sua virgindade pela internet, e não é para comprar comida para os irmãozinhos menores, amparar a velha mãe, ou pagar a faculdade.
Ambicionamos o que na verdade são bugigangas, que, se trocadas por uma atenção maior com a realidade do país e tantas carências que nos assolam, poderiam transformar nossa paisagem. (Claro que também tenho meus aparelhos, o universo eletrônico é imprescindível, mas não sei se por eles eu trocaria algo que acho sério.)
Não critico os milhões que se abstiveram ou votaram em branco, que aqui chamo, quem sabe injustamente (detesto rótulos, mas às vezes são necessários), de descrentes ou mesmo fúteis. Critico, embora sem resultado, eu sei, o sistema que nos torna conformados, que nos dá pão e circo em lugar de boa educação e preparo para bons cargos e funções.
Critico a nossa sonolência e os encantamentos alienantes como poder comprar, comprar, comprar. E confesso que muitas vezes também me perseguem sedutores fantasmas de esquecimento, omissão e fuga: de me recolher à nossa casinha no mato e lá ficar apenas contemplando a natureza, escrevendo, saboreando afetos, sabendo que minha interferência seria um eco frágil perdido num enorme vazio de desinteresse.
Também a mim espreita em alguns dias com seus olhinhos marotos a ideia inescrupulosa: um voto a mais não adianta nada, para que se incomodar, procurar saber, sair de casa e votar? Pois talvez adiante: um voto mais um voto, mais um voto, mais um voto — que acabam valendo mais do que o nosso fascinante objeto de desejo —, as coisas podem se transformar.
Nem todo mundo é cego, surdo, mudo, ignorante ou conformado. Olhando bem, veremos que algumas coisas quase majestosas se movem no país. Quem sabe vai-se mover até mesmo a montanha do nosso desencanto.

A FORMAÇÃO DE UM POVO


A formação de um povo pode ser olhada sob vários aspectos. Aqui eu falo da formação cultural, informação, crescimento, consciência dos direitos e deveres de quem vive numa democracia verdadeira, que se interesse por um povo formado e informado.
Aqui entra primariamente a educação, que venho comentando sem conseguir esgotar, assunto inexaurível na vida privada de todo cidadão e na existência geral de um povo. É preciso ter em mente que, para os líderes, sejam quais forem, esse deve ser um interesse primordial em sua atividade.
A mim me preocupa a redução do nível de formação e informação que nos oferecem. Escrevi muito sobre as cotas, com que, em lugar de melhorar a educação pela base, subindo o nível do precário ensino elementar, se reduz o nível do ensino superior, para que se adapte aos que lá entram mais por cota do que por mérito e preparo, em lugar de ser, como deveria, o inverso.
Com isso, nosso ensino superior, já tão carente e ruim, com algumas gloriosas exceções, piora ainda mais. Vejam-se os dados assustadores de reprovação, no exame da Ordem dos Advogados do Brasil, de candidatos saídos dos nossos cursos de direito.
Os exames de igual caráter para egressos de cursos de medicina ainda não apresentam resultado tão incrivelmente ruim, mas começam a nos deixar alertas pois esses médicos vão lidar com o nosso corpo, a nossa vida.
Estudantes de letras frequentemente nem sabem ortografia, e mais: não conseguem se expressar por escrito, não têm pensamento claro e seguro, não foram habituados, desde cedo, a argumentar, a pensar, a analisar, a discernir, a ler e a escrever.
Agora, pelo que leio, parece que vão conseguir piorar ainda mais a situação, pois a meninada só precisa se alfabetizar no fim do 3º ano da escola elementar. Pergunto: o que estarão fazendo nos primeiros dois anos de escola? Brincando? Gazeteando? A escola vai fingir que está ensinando, preparando para a vida e a profissão? E os pais que se interessam, o que podem esperar de tal ensino?
Aos 8 anos, meninos e meninas já deveriam estar escrevendo direito e lendo bastante — claro que em escolas públicas de qualquer ponto do país onde os governos tivessem colocado professores bem pagos, seguros e com boa autoestima em escolas nas quais cada sala de aula tenha uma prateleira com livros doados pelos respectivos governos, municipal, estadual ou federal, interessados na formação do seu povo.
Qualquer coisa diferente disso é ilusão pura. Não resolve enviar centenas de jovens ao exterior ou trazer estudantes estrangeiros para cá, se a base primeira do ensino é ruim como a nossa, pois não adianta um telhado de luxo sobre paredes rachadas em casas construídas sobre areia movediça.
Como não adianta dar comida a quem precisaria logo a seguir de estudo e trabalho que proporcionasse crescimento real, projetos e horizontes em lugar da dependência de meninos que não conseguem largar o peito materno mesmo passada a idade adequada.
O que vai acontecer? Com certeza vai se abrir e aprofundar mais o fosso entre alunos saídos de escolas particulares que ainda consigam manter um nível e objetivo de excelência e a imensa maioria daqueles saídos de escolas públicas ou mesmo privadas em que o rebaixamento de nível se instalar.
Grandes e pequenas empresas e indústrias carecem de mão de obra especializada e boa, milhares de vagas oferecidas não são preenchidas porque não há mão de obra preparada: imaginem se a alfabetização for concluída no fim do 3o ano elementar, quando os alunos tiverem já 8 anos, talvez mais, quando e como serão preparados?
Com que idade estarão prontos para um mercado de trabalho cada vez mais exigente? Ou a exigência também vai cair e teremos mais edifícios e outras obras mal construídos, serviços deixando a desejar, nossa excelência cada vez mais reduzida?
Não sei se somos um povo cordial: receio que sejamos desinteressados, mal orientados e conformados, achando que é só isso que merecemos. Ou nem pensando no assunto.   

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Dia do Detento


                              
Hoje, 24 de maio, é o Dia de Detento.
Quantas pessoas sabem que essa data, foi decretada em homenagem a eles (detentos) ? Isso mesmo, pouquíssimas.
Bom, diante da realidade do nosso país, há pouco o que se comemorar. Sabemos da deficiência que ocorre nos presídios brasileiros, geralmente estão superlotados. Essa data é importante para refletirmos sobre o nosso Direito Penal, uma Legislação cheio de regra, e com pouca justiça. O que nos impede de termos um sistema mais rígido, e sério? Talvez seria a corrupção?  Vou deixar que cada um de vocês reflitam sobre essas perguntas, e cheguem a suas próprias conclusões.
Outro ponto importantíssimo: Como podem ficar no mesmo presídio, um homem que tem 20 homicídios na sua ficha criminal, e um outro homem que rouba alimento no mercado, pra sustentar sua família? Não que o homem que roubou o alimento esteja certo, mas a convivência com esse rapaz que tem 20 homicídios, não o incentivaria a praticar outros delitos? Aí entra a questão da ressocialização dos ex-presidiários.
O preconceito existe em qualquer lugar. Dificilmente um empresário, irá empregar um ex-presidiário. Um exemplo bem comum: tal pessoa, que não conhece fulano direito, fica sabendo que ele foi preso, a primeira reação é ficar com medo ou se afastar, isso é fato.  A maioria dos detentos, são reincidentes. Quem gosta de viver na miséria, passando fome, não ter o que vestir, não ter um sistema de saúde digno? Essas pessoas acabam indo pelo caminho mais fácil ( o que eu considero mais difícil), se envolve com o que não presta, perde sua vida, a troco de nada. Mas tudo isso é conseqüência de um conjunto de deficiência que existe em nosso país, desde a educação até o respeito.
A mudança tem que partir de todos. Espero um mundo melhor para próxima geração. Que eles não vivam tão apavorados quanto nós, diante de tamanha violência, que não precisem viver atrás das grades de suas casas, e possam andar livres na rua. Precisamos de uma justiça e um sistema mais digno, para que os assassinos, não recuperados, não matem outras pessoas inocentes, e que os ladrões, que nem sempre são pretos e mal vestidos, tem uma punição correta. Só mais um detalhe, já que ‘gostamos’ tanto de pegar alguns modelos da atual potência do mundo, vamos usar o estilo de segurança de lá, dinheiro temos, basta ser bem aplicado.

Amanda Soriano

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Dia do Abraço


Hoje é o dia do abraço, vamos comemorar?
Mas como comemorar o Dia do Abraço, numa época onde a pessoas pouco se abraçam?
O abraço deixou de ser caloroso e apertado para se tornar simbólico e na maioria das vezes um simples recado.
Já notou que as pessoas deixaram de se abraçar de uns tempos pra cá?
Tudo bem que o uso da internet é uma ferramenta muito útil em nossas vidas, mas ela não substitui a tudo não. Nada pode substituir um abraço de feliz aniversário, nem mesmo a mais linda mensagem postada no Facebook. Outro dia eu mesmo me peguei nesse erro, então foi aniversário da minha colega de sala e logo de manhã fiz questão de parabenizá-la, à noite nos encontramos na sala de aula e eu simplesmente ignorei o fato de ser seu aniversário e não lhe dei o meu abraço, perdi a chance de receber um também.
Espanto-me quando presencio duas pessoas se despedindo com a seguinte frase:
- Poxa, João, muito bom te ver. Mande lembranças à família, aquele abraço irmão! – E cada um segue seu caminho sem ao menos apertarem as mãos.
Isso não pode acontecer, não podemos deixar de nos abraçar, precisamos dessa troca de carinho.
E nesse Dia do Abraço, equipe Lya Luft não lhe mandará um abraço, vamos te dar assim que nos encontrarmos!

Daniela Mattos


terça-feira, 21 de maio de 2013

Às Vezes É Preciso Recolher-se

                                 

Às vezes é preciso recolher-se. O coração não quer obedecer, mas alguma vez aquieta; a ansiedade tem pés ligeiros, mas alguma vez resolve sentar-se à beira dessas águas. Ficamos sem falar, sem pensar, sem agir. É um começo de sabedoria, e dói. Dói controlar o pensamento, dói abafar o sentimento, além de ser doloroso parece pobre, triste e sem sentido. Amar era tão infinitamente melhor; curtir quem hoje se ausenta era tão imensamente mais rico. Não queremos escutar essa lição da vida, amadurecer parece algo sombrio, definitivo e assustador. Mas às vezes aquietar-se e esperar que o amor do outro nos descubra nesta praia isolada é só o que nos resta. Entramos no casulo fabricado com tanta dificuldade, e ficamos quase sem sonhar. Quem nos vê nos julga alheados, quem já não nos escuta pensa que emudecemos para sempre, e a gente mesmo às vezes desconfia de que nunca mais será capaz de nada claro, alegre, feliz. Mas quem nos amou, se talvez nos amar ainda há de saber que se nossa essência é ambigüidade e mutação, este silencio é tanto uma máscara quanto foram, quem sabe, um dia os seus acenos

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Canção na plenitude


Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)

O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.




Educação de quarto mundo

Em homenagem ao Dia do Pedagogo, tão pouco valorizado, aí vai reflexão sobre nossa educação.         
                                    

"Por que nos contentarmos com o pior, o medíocre, se podemos 
ter o melhor e não nos falta o recurso humano para isso?

No meio da tragédia do Haiti, que comove até mesmo os calejados repórteres de guerra, levo um choque nacional. Não são horrores como os de lá, mas não deixa de ser um drama moral. O relatório "Educação para todos", da Unesco, pôs o Brasil na 88ª posição no ranking de desenvolvimento educacional. Estamos atrás dos países mais pobres da América Latina, como o Paraguai, o Equador e a Bolívia. Parece que em alfabetizar somos até bons, mas depois a coisa degringola: a repetência média na América Latina e no Caribe é de pouco mais de 4%. No Brasil, é de quase 19%.
No clima de ufanismo que anda reinando por aqui, talvez seja bom acalmar-se e parar para refletir. Pois, se nossa economia não ficou arruinada, a verdade é que nossas crianças brincam na lama do esgoto, nossas famílias são soterradas em casas cuja segurança ninguém controla, nossos jovens são assassinados nas esquinas, em favelas ou condomínios de luxo somos reféns da bandidagem geral, e os velhos morrem no chão dos corredores dos hospitais públicos. Nossos políticos continuam numa queda de braço para ver quem é o mais impune dos corruptos, a linguagem e a postura das campanhas eleitorais se delineiam nada elegantes, e agora está provado o que a gente já imaginava: somos péssimos em educação.
Pergunta básica: quanto de nosso orçamento nacional vai para educação e cultura? Quanto interesse temos num povo educado, isto é, consciente e informado - não só de seus deveres e direitos, mas dos deveres dos homens públicos e do que poderia facilmente ser muito melhor neste país, que não é só de sabiás e palmeiras, mas de esforço, luta, sofrimento e desilusão?
Precisamos muito de crianças que saibam ler e escrever no fim da 1ª série elementar; jovens que consigam raciocinar e tenham o hábito de ler pelo menos jornal no 2º grau; universitários que possam se expressar falando e escrevendo, em lugar de, às vezes com beneplácito dos professores, copiar trabalhos da internet. Qualidade e liberdade de expressão também são pilares da democracia. Só com empenho dos governos, com exigência e rigor razoáveis das escolas - o que significa respeito ao estudante, à família e ao professor - teremos profissionais de primeira em todas as áreas, de técnicos, pesquisadores, jornalistas e médicos a operários. Por que nos contentarmos com o pior, o medíocre, se podemos ter o melhor e não nos falta o recurso humano para isso? Quando empregarmos em educação uma boa parte dos nossos recursos, com professores valorizados, os alunos vendo que suas ações têm consequências, como a reprovação - palavra que assusta alguns moderníssimos pedagogos, palavra que em algumas escolas nem deve ser usada, quando o que prejudica não é o termo, mas a negligência. Tantos são os jeitos e os recursos favorecendo o aluno preguiçoso que alguns casos chegam a ser bizarros: reprovação, só com muito esforço. Trabalho ou relaxamento têm o mesmo valor e recompensa.
Sou de uma família de professores universitários. Exerci o duro ofício durante dez anos, nos quais me apaixonei por lidar com alunos, mas já questionava o nível de exigência que podia lhes fazer. Isso faz algumas décadas: quando éramos ingênuos, e não antecipávamos ter nosso país entre os piores em educação. Quando os alunos ainda não usavam celular e iPhone na sala de aula, não conversavam como se estivessem no bar nem copiavam seus trabalhos da internet - o que hoje começa a ser considerado normal. Em suma, quando escola e universidade eram lugares de compostura, trabalho e aprendizado. O relaxamento não é geral, mas preocupa quem deseja o melhor para esta terra.
Há gente que acha tudo ótimo como está: os que reclamam é que estão fora da moda ou da realidade. Preparar para as lidas da vida real seria incutir nos jovens uma resignação de usuários do SUS, ou deixar a meninada "aproveitar a vida": alguém pode me explicar o que seria isso?

domingo, 19 de maio de 2013

Noite


Voz que nunca desiste, na mais negra das águas da mais longa das noites. 





Vale a pena

[...] acho que a vida é um processo... É como subir uma montanha. Mesmo que no fim não se esteja tão forte fisicamente, a paisagem visualizada é melhor.

sábado, 18 de maio de 2013

A boa escola



 A boa escola

Meu brilhante colega Gustavo Ioschpe, uma das mais lúcidas vozes no que diz respeito à educação, escreveu sobre o que é um bom professor. Eu já começava este artigo sobre o que acho que deva ser uma boa escola, então aqui vai.
Primeiro, a escola tem de existir. No Brasil há incrivelmente poucas escolas em relação à necessidade real. Têm de existir escolas para todas as crianças, em todas as comunidades, as mais remotas, com qualidades básicas: não ultrapassar o número de alunos bem acomodados, e que eles não tenham de se locomover para muito longe; instalações dignas, que vão das mesas as paredes, telhado, pátio para diversão e recreio, lugar para exercício físico e esportes; instalações sanitárias decentes, cozinha para alimentar os que não comem suficientemente em casa; alguém com experiência médica ou de enfermagem para atender os que precisarem. Em cada sala de aula, naturalmente, uma boa prateleira com livros sem dúvida doados pelos governos federal, estadual, municipal. E que ali se ensine bem o essencial: aritmética, bom uso da linguagem, noções de história e geografia para que saibam quem são e onde no mundo se situam. Falei até aqui apenas de ensino elementar em escolas menos privilegiadas economicamente. Em comunidades mais resolvidas nesse sentido, tudo isso não será apenas bom, mas excelente, desde aparte material até professores muito bem preparados que sejam bem exigidos e bem pagos.
No chamado 2º grau, além de livros, quem sabe computadores, mas - ainda que escandalizando alguns - creio que esses objetos maravilhosos, que eu mesma uso constantemente, não substituem um bom professor. E que, nesse degrau da vida, todos sejam preparados para a universidade, desde que queiram e possam. Pois nem todos querem uma carreira universitária, nem todos têm capacidade para isso: para eles, excelentes escolas técnicas, depois das quais podem ter mais ganho financeiro do que a maioria dos profissionais liberais. Professores com mestrado e se possível doutorado, diretores que conheçam administração, psicólogos que conheçam psicologia, todos com saber e postura que os alunos respeitem a fim de que possam aprender.
Finalmente a universidade, que enganosamente se julga ser o único destino digno de todo mundo (já mencionei acima os cursos técnicos cada dia melhores e mais especializados). Universidade precisa existir, mas não na abundância das escolas elementares. É incompreensível e desastrosa a multiplicação de faculdades de medicina, por exemplo, cujas falhas terão efeitos dramáticos sobre vidas humanas. Temos pelo país muitas onde alunos não estudam anatomia, pois não há biotério, não têm aulas práticas, pois não há hospital-escola. Essa é uma realidade assustadora, mas bastante comum, que, parece, se tenta corrigir.
Dessas pseudo  faculdades sairão alunos reprovados nas essenciais provas do CRM, mas que eventualmente vão trabalhar sem condição de atender pacientes. Faculdades de direito pululam pelo país, sem professores habilitados, sem boas bibliotecas, formando advogados que nem escrever razoavelmente conseguem, além de desconhecer as leis - e reprovados aos magotes nas importantíssimas provas da OAB.
Coisa semelhante aconteceria com faculdades de engenharia mal preparadas, se existirem, de onde precisam sair profissionais que garantam segurança em obras diversas, de edifícios, casas, estradas, pontes. Vejam que aqui comentei apenas alguns dos inúmeros cursos existentes, muitos com excelente nível, mas não se ignorem os que não têm condições de funcionar, e mesmo assim... existem. Em todas essas fases, segundo cada nível, incluam-se professores bem preparados, muito dedicados, e decentemente pagos - professor não é sacerdote nem faquir. O que aqui escrevo é mero, simples, bom-senso. Todos têm direito de receber a educação que os coloque no mundo sabendo ler, escrever, pensar, calcular, tendo ideia do que são e onde se encontram, e podendo aspirar a crescer mais. Isso é dever de todos os governos. E é nosso dever esperar isso deles.

Lya Luft

''Três senhoras sentadas''


As mulheres sentadas no ônibus representam um instante de alívio. Breve trégua, até a próxima tentativa (Foto: Hoje em Dia)

Eram três mulheres de uns 50 anos, simples, robustas, cansadas e suadas, esperando ônibus no Rio havia mais de uma hora. Calor, desconforto. A van que costumavam usar a caminho de seu emprego fora desativada com outras. Problema nas vans? Em vez de corrigir, a gente suspende tudo. O povo que se vire.
Mas não conseguiam se virar as três senhoras cansadas. Finalmente um ônibus para; por uma raríssima exceção, não está lotado. Deve ter passado a hora do pico. As três entram, depois aparecem em janelas acenando para a câmera da TV com a folha de papel com que se abanavam na rua. Felizes, lustrosas, risonhas: conseguiram um lugar para sentar, coisa mais difícil do que cair dinheiro do céu. Nós somos essas pessoas que ficam felizes por poder se sentar em mais uma longa, quente, infernal viagem até seu trabalho — aonde chegariam atrasadas, com desconto, xingação, qualquer coisa. Mas estamos acostumados.
A gente abre o jornal de manhã e liga a televisão: notícias, apesar de seguidamente prometermos a nós mesmos não envenenar mais a alma ao começar o dia com o atroz desfile de barbaridades econômicas, policiais ou éticas. O que penso que seja burrice nossa, mas ninguém é perfeito. As novidades são violentas: um dos monstros assassinos que queimaram viva uma dentista de classe média, que sustentava pais velhos e irmã deficiente trabalhando num consultório no fundo da casa, confessou o ato e é menor de idade. Vai passar um tempinho numa casa socioeducativa?
No âmbito da educação, mais espanto: as universidades não precisam mais exigir título de mestrado ou doutorado para seus professores. A desculpa é que profissionais brilhantes conseguem ensinar sem esse título. Minha sugestão seria, em lugar de baixar ainda mais o nível, nesses casos raríssimos apelar para o “notório saber”… Mas receio que o autor dessa maravilha ignore o que é isso.
Nestes mesmos dias, anunciou-se outra dessas propostas que pululam feito moscas na carniça: o Supremo não seria mais supremo, mas submetido em várias coisas à análise e aprovação do Congresso. Liguei para meus filhos, como costumo fazer: “Está começando o fim da nossa democracia”. Será o fascismo se instalando, a Justiça nas mãos de deputados e senadores nem sempre votados — tem gente que ocupa o lugar como suplente, sem um voto que seja. Vários deles, aliás, réus condenados, mas que por um desses nossos absurdos continuam na tribuna, votando, dando ordens, quando deviam estar recolhidos.
Moradias populares, concedidas a gente de baixa renda, o sonho de uma vida, muitas nem habitadas, já desmoronam. A caixa-d’água caiu em cima da cama em uma delas, mas ninguém morreu. Que alegria. Edifícios erguidos onde desmoronou o malfadado Morro do Bumba, desgraça mais do que anunciada, inabitáveis, agora demolidos e reconstruídos — nós, o povo, pagamos, como sempre. O dinheiro que ali devia ter sido aplicado escorregou para bolsos alheios como em tantos projetos que, com boa gestão, seriam positivos.
Manifestantes vários causam estragos sérios em edifícios públicos; o conserto pagamos nós, o povo. Eles quase sempre ficam impunes. Mas, se eu destruísse o bem público, certamente não estaria livre para aqui escrever. Aliás, de onde vêm essas multidões que não estão na fábrica, no escritório, na escola ou na enxada?
Enquanto escrevo esta coluna, parece que a nova proposta de reduzir o nível já inferior do nosso ensino superior será arquivada: resta-nos alguma lucidez. O plano de amordaçar a imprensa anda quieto, mas voltará a rosnar. E o projeto de castrar o Supremo, o último reduto de moralidade e respeito, também será engavetado: continuamos uma democracia.
Bom se com ele engavetassem a mentira, a roubalheira, a impunidade, a insegurança. Eis a nossa perplexidade: o que vão querer nos impingir, mas esconder por breve tempo, se a gente reclamar mais alto? As três mulheres sentadas no ônibus representam um instante de alívio. Breve trégua, até a próxima tentativa.

fonte: Revista Veja

" Canção em Rota de Voo "

''Antes os dias eram apenas dias : perdas e ganhos , tarefas cumpridas, solidão e algumas alegrias. Agora , objetos familiares, ganham contornos de sonho, palavras são aves do paraíso, o cotidiano virou do avesso  e se tornou milagre. Quero um novo amor , tão leve como se dançasse numa praia uma menina ."

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Crime e Castigo

Ilustração Atômica Studio


"Estamos levando na brincadeira a questão 
do erro e do castigo, ou do crime e da punição. 
Sem limites em casa e sem punição de crimes 
fora dela, nada vai melhorar"

Tomo emprestado o título do romance do russo Dostoiévski, para comentar a multiplicação dos crimes nesta cultura torta, desde os pequenos "crimes" cotidianos - falta de respeito entre os pais e filhos, maus-tratos a empregados, comportamento impensável de políticos e líderes, descuido com nossa saúde, segurança, educação - até os verdadeiros crimes: roubos, assaltos. assassinatos, tão incrivelmente banalizados nesta sociedade enferma. A crise de autoridade começa em casa, quando temos medo de dar ordens e limites ou mesmo castigos aos filhos, iludidos por uma série de psicologismos falsos que pululam como receitas de revista ou programa matinal de televisão e que também invadiram parte das escolas. Crianças e adolescentes saudáveis são tratados a mamadeira e cachorro-quente por pais desorientados e receosos de exercer qualquer comando. Jovens infratores são tratados com imbecis, embora espertos, e como inocentes, mesmo que perversos estupradores, frios assassinos, traficantes e ladrões comuns. São encaminhados para os chamados centros de ressocialização, onde nada aprendem de bom, mas muito de ruim, e logo voltam às ruas para continuar seus crimes.Estamos levando na brincadeira a questão do erro e do castigo, ou do crime e da punição. A banalização da má-educação em casa e na escola, e do crime fora delas, é espantosa e tem consequências dramáticas que hoje não conseguimos mais avaliar. Sem limites em casa e sem punição de crimes fora dela, nada vai melhorar. Antes de mais nada, é dever mudar as leis - e não é possível que não se possa mudar uma lei, muitas leis. Hoje, logo, agora! - O ensino nas últimas décadas foi piorando, em parte pelo desinteresse dos governos e pelo péssimo incentivo aos professores, que ganham menos do que uma empregada doméstica, em parte como resultado de "diretrizes" que tornaram tudo confuso, experimental, com alunos servindo de cobaias, professores lotados de teorias (que também não funcionam). Além disso, aqui e ali grupos de ditos mestres passaram a se interessar mais por politicagem e ideologia do que pelo bem dos alunos e da própria classe. Não admira que em alguns lugares o respeito tenha sumido, os alunos considerem com desdém ou indignação a figura do antigo mestre e ainda por cima vivam, em muitas famílias, a dor da falta de pais: em lugar deles, como disse um jovem psicólogo, eles têm em casa um gatão e uma gatinha. Dispensam-se comentários. 
Autoridade, onde existe, é considerada atrasada, antiquada e chata. Se nas famílias e escolas isso é um problema, na sociedade, com nossas leis falhas, sem rigor nem coerência, isso se torna uma tragédia. Não me falem em policiais corruptos, pois a maioria imensa deles é honrada, ganha vergonhosamente pouco, arrisca e perde a vida, e pouco ligamos para isso. Eu penso em leis ruins e em prisões lotadas de gente em condições animalescas. Nesta nossa cultura do absurdo, crimes pequenos levam seus autores a passar anos num desses lixões de ente chamados cadeias (muitas vezes sem sequer ter havido ainda julgamento e condenação), enquanto bandidos perigosos entram por uma porta e sem pela outra, para voltar e cometer seus crimes, ou gozam na cadeia de um conforto que nem avaliamos.
Precisamos de punições justas, autoridade vigilante, uma reforma geral das leis para impedir perversidade ou leniência, jovens criminosos julgados como criminosos, não como crianças malcriadas. Ensino, educação e justiça tornaram-se tão ruins, tudo isso agravado pelo delírio das drogas fomentado por traficantes ou por irresponsáveis que as usam como diversão ou alívio momentâneo, que passamos a aceitar tudo como normal: "É assim mesmo". Muito crime, pouco castigo, castigo excessivo ou brando demais, leis antiquadas ou insuficientes, e chegamos aonde chegamos: os cidadãos reféns dentro de casa ou rato assustados nas ruas, a bandidagem no controle; pais com medo dos filhos, professores insultados pela meninada sem educação. Seria de rir, se não fosse de chorar.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Erotismo feminino, mais uma receita?



"Andamos desatinadas com essa onda de erotismo, como se isso fosse novidade: nunca antes sentimos nada? Éramos bonecas de pano?"
"Andamos desatinadas com essa onda de erotismo, como se isso fosse novidade: nunca antes sentimos nada? Éramos bonecas de pano?" (Ilustração: Atômica Estúdio)

 EROTISMO FEMININO, MAIS UMA RECEITA?
Lya Luft
Lya Luft
Parece que quanto mais insatisfeitos estamos em nossa intimidade, mais bradamos aos quatro ventos sobre sexualidade, erotismo e coisas semelhantes. Mais receitas aparecem, mais obrigações: nisso como em tantas coisas somos escravos do “ter de”.
A gente tem de ser rico, ser famoso, ter os melhores cartões de crédito, comprar muito, viajar muito, conhecer os resorts, ser bonito, jovem, magro, atlético, conhecer comidas sofisticadas mas estar de dieta, apreciar bons vinhos mas beber só água (sem gás!), ser saudável mas entupir-se de remédios, enfim: viver está mais complicado.
Agora, “temos de” ser heróis da sexualidade.
Jovens, maduros, homens e mulheres, todos caem na onda do erotismo forçado, artificial, receitado, acrobático, difícil e angustiado. Longe do que é natural, se é que temos ainda em nós a escuta e o sentimento do natural, embora sejamos, muitos de nós, naturebas.
O tema erotismo feminino anda cansativo, exagerado, às vezes beirando o ridículo. Mulheres se permitem ou precisam de permissão do feroz e brutalhão patrão masculino, para viver uma sexualidade boa — dependendo do que isso signifique para cada pessoa? Não acredito que na antiga Grécia as nada consideradas mulheres sofressem por cumprir seu dever de concubinas, ou que na era vitoriana todas tivessem apenas de suportar o parceiro na cama.
Os costumes eram outros, sim, bem como preceitos e preconceitos, mas o ser humano foi sempre o mesmo, com a mesma capacidade de amar, de sofrer, de sonhar, de ter prazeres, quem sabe mais intensos por serem ocultos.
Já escrevi que até na Idade Média mulheres, embora raras, davam aulas de teologia ou arte nas grandes universidades, mulheres comandavam seu feudo, quando o marido estava nas cruzadas, mulheres chegaram a fundar, na mesma época, ligas de artesãs para administrar seu trabalho.
Não acredito que no começo do século passado as mulheres que não trabalhavam fora nem ganhavam seu dinheiro não tivessem nenhuma voz dentro de casa. A não ser que por temperamento e medo fossem gueixas submissas de um senhor boçal, frequentemente eram as conselheiras dele, e muitos negócios entre donos de vastas terras ou de pequenas colônias só eram fechados depois de se ouvir a voz da mulher.
Lógico que as coisas mudaram muito, e em grande parte para melhor: não nos casamos mais por imposição paterna, não ficamos mais reclusas em casa, não precisamos ficar de lado com as outras mulheres quando há festa e os homens têm suas conversas ditas interessantes no salão no outro lado.
Não precisamos mais ter todos os filhos que a natureza determinar nem ter uma vida plena só com aliança no dedo. Podemos (em geral precisamos) trabalhar, ter cargos de mando, viajar sozinhas, enfim, podemos ter alguma liberdade — toda a liberdade ninguém tem.
Mas, talvez como quem come mel pela primeira vez se lambuza, andamos desatinadas com o tal erotismo, como se fosse novidade: nunca antes sentimos nada, éramos bonecas de pano? Somos melhores homens e mulheres, mais felizes, mais amorosos, mais unidos, estamos construindo algo melhor juntos sob o império de tais “deveres”?
Ou a obrigação de “ter de” fazer isso e aquilo nos inibe e nos aflige? O que não é espontâneo, amoroso, sutil, um pouco secreto, particular de cada casal, não há de trazer grandes alegrias. Sair correndo a comprar objetos eróticos nos torna mais plenas? Comparando com outras mulheres os novos fetiches, ou brandindo na cara do parceiro tais novidades ou textos, muitas dizem “agora sim, ele vai aprender o que e como fazer para me agradar”, as escravas se tornaram capatazes, como tantas vezes na história?
E, quando as novidades incluem sadomasoquismo, possivelmente nem sempre temos o erótico, mas o perigoso.
Do jeito que andamos, em breve os homens também vão requisitar exóticas e forçadas (ou irregulares) mudanças na língua portuguesa, e teremos frases como “O motoristo do pediatro de minhas filhas agora é estudanto de educação física”.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Uma educação que nos torna medíocres distraído



"Queremos, aceitamos, pão e circo, a Copa, a Olimpíada, a balada, o joguinho, o desconto, o prazo maior para nossas dívidas, o não saber de nada sério: a gente não quer se incomodar. Ou pior: nós temos a sensação de que não adianta mesmo" (Ilustração: Guto Cassiano)


MEDÍOCRES DISTRAÍDOS



Leio com tristeza sobre quanto países como Coreia do Sul e outros estimulam o ensino básico, conseguem excelência em professores e escolas, ótimas universidades, num crescimento real, aquele no qual tudo se fundamenta: a educação, a informação, a formação de cada um.
Comparados a isso, parecemos treinar para ser medíocres. Como indivíduos, habitantes deste Brasil, estamos conscientes disso, e queremos — ou vivemos sem saber de quase nada? Não vale, para um povo, a desculpa do menino levado que tem a resposta pronta: “Eu não sabia”", “Não foi por querer”.
Pois, mesmo com a educação — isto é a informação — tão fraquinha e atrasada, temos a imprensa para nos informar. A televisão não traz só telenovelas ou programas de auditório: documentários, reportagens, notícias, nos tornam mais gente: jornais não têm só coluna policial ou fofocas sobre celebridades, mas nos deixam a par e nos integram no que se passa no mundo, no país, na cidade.
Alienação é falta grave: omissão traz burrice, futilidade é um mal. Por omissos votamos errado ou nem votamos, por desinformados não conhecemos os nossos direitos, por fúteis não queremos lucidez, não sabemos da qualidade na escola do filho, da saúde de todo mundo, da segurança em nossas ruas.
O real crescimento do país e o bem da população passam ao largo de nossos interesses. Certa vez escrevi um artigo que deu título a um livro: “Pensar é transgredir”. Inevitavelmente me perguntam: “Transgredir o quê?”. Transgredir a ordem da mediocridade, o deixa pra lá, o nem quero saber nem me conte, que nos dá a ilusão de sermos livres e leves como na beira do mar, pensamento flutuando, isso é que é vida. Será? Penso que não, porque todos, todos sem exceção, somos prejudicados pelo nosso próprio desinteresse.
Nosso país tem tamanhos problemas que não dá para fingir que está tudo bem, que somos os tais, que somos modelo para os bobos europeus e americanos, que aqui está tudo funcionando bem, e que até crescemos. Na realidade, estamos parados, continuamos burros, doentes, desamparados, ou muito menos burros e doentes e desamparados do que poderíamos estar. Já estivemos em situação pior ? Claro que sim.
Já tivemos escravidão, a mortalidade infantil era assustadora, os pobres sem assistência, nas ruas reinava a imundície, não havia atendimento algum aos necessitados (hoje há menos do que deveria, mas existe). Então, de certa forma, muita coisa melhorou. Mas poderíamos estar melhores, só que não parecemos interessados.
Queremos, aceitamos, pão e circo, a Copa, a Olimpíada, a balada, o joguinho, o desconto, o prazo maior para nossas dívidas, o não saber de nada sério: a gente não quer se incomodar. Ou pior: nós temos a sensação de que não adianta mesmo. Mas na verdade temos medo de sair às ruas, nossas casas e edifícios têm porteiro, guarda, alarmes e medo.
Nossas escolas são fraquíssimas, as universidades péssimas, e o propósito parece ser o de que isso ainda piore.
Pois, em lugar de estimularmos os professores e melhorarmos imensamente a qualidade de ensino de nossas crianças, baixamos o nível das universidades, forçando por vários recursos a entrada dos mais despreparados, que naturalmente vão sofrer ao cair na realidade. Mas a esses mais sem base, porque fizeram uma escola péssima ou ruim, dizem que terão tutores no curso superior para poder se equilibrar e participar com todos.
Porque nós não lhes demos condições positivas de fazer uma boa escola, para que pudessem chegar ao ensino superior pela própria capacidade, queremos band-aids ineficientes para fingir que está tudo bem. Não se deve baixar o nível em coisa alguma, mas elevar o nível em tudo.
Todos, de qualquer origem, cor, nível cultural e econômico ou ambiente familiar, têm direito à excelência que não lhes oferecemos, num dos maiores enganos da nossa história.
Não precisamos viver sob o melancólico império da mediocridade que parece fácil e inocente, mas trava nossas capacidades, abafa nossa lucidez, e nos deixa tão agradavelmente distraídos.




segunda-feira, 13 de maio de 2013

Vida

                         

 A vida é maravilhosa, mesmo quando dolorida. 
Eu gostaria que na correria da época atual a gente pudesse se permitir, criar, uma pequena ilha de contemplação, de autocontemplação, de onde se pudesse ver melhor todas as coisas: com mais generosidade, mais otimismo, mais respeito, mais silêncio, mais prazer. Mais senso da própria dignidade, não importando idade, dinheiro, cor, posição, crença. Não importando nada.

                          



domingo, 12 de maio de 2013

Mulher, Mãe...



"Há gente que, em vez de destruir constrói; em lugar de invejar, presenteia; em vez de envenenar, embeleza; em lugar de dilacerar, reúne e agrega."


"A culpa faz parte do inconsciente coletivo feminino. O sentimento de responsabilidade da mulher com a família é uma coisa espantosa e brutal. "

A mãe da gente





Não gosto de escrever sobre ou em datas especiais, mas desta vez falo dessa singular criatura que é a mãe da gente, e dessa mais singular ainda relação entre nós e ela. Entre ela e nós? Hà discrepâncias iniciais: o que sentimos e pensamos não coincide, em geral, com o que ela sente e pensa. Um dos dramas humanos é a distância entre a intenção de quem disse a palavra ou fez o gesto, o olhar, e quem os recebeu e tantas vezes interpretou erradamente, guardando mágoas das quais o causador nunca teve a menor ideia, muito menos intenção.

A intensidade com que sentimentos e cultura caracterizam e oneram as relações humanas, sobretudo essa, de mães e filhos, pode ser pungente. Algumas brincadeiras bobas não são tão bobas: "Mãe de mais, vira mimado; mãe de menos, fica revoltado". Peso excessivo se coloca sobre os ombros de mãe, e de pai também. Se uma boa família, isto é, razoavelmente saudável, em que corra mais forte o rio do afeto e da alegria do que o da frieza e do rancor, tende a produzir indivíduos emocionalmente mais saudáveis, a regra tem muitas exceções. Boas famílias podem conter filhos neuróticos, violentos, drogados, e famílias disfuncionais podem produzir gente equilibrada, positiva, produtiva.

Partindo do princípio de que relações são complicadas, ter um filho mais incrível experiência humana), ter de (ou querer) criá-lo para que seja feliz (seja lá o que isso significa), cuidar de sua saúde, seu desenvolvimento, dar-lhe afeto, bom ambiente, encontrar o dificílimo equilíbrio entre vigiar (pois quem ama cuida) e liberar (para que se desenvolva), é tarefa gigantesca. Que a mais simples mãe do mundo pode realizar sem se dar conta, e na qual a mais sofisticada mãe pode falhar de maneira estrondosa, dando-se conta disso, ou jamais pensando nisso.

Neste universo de contradições, pressões, exigências, variedades e ansiedade em que andamos metidos, qualquer tarefa fica mais difícil, que dirá a de manter, concreta e emocionalmente, uma família numa relação boa dentro do possível. Os compromissos de pais e mães se avolumam, as necessidades e exigências de filhos e filhas se multiplicam, as ofertas se abrem como bocas devoradoras, o stress, a pressa, a multiplicidade de tudo, nos deixam pouco tempo físico para conviver com alegria ou escutar com atenção, e pouca disponibilidade psíquica: também pais e mães estão aflitos.

Se antes o pai chegava em casa à noite cansado, querendo jantar, ler o jornal, olhar um pouco os filhos e a mulher descansar, hoje chegam exaustos os dois: a mãe, além disso, pela constituição biopsíquica com que a dotou a mãe natureza (para preservação da espécie), e pela culpa que nossa cultura lhe impõe (ou é uma culpa natural e inevitável), chega duplamente sobrecarregada. Incluam-se aqui tarefas que parecem banais, como olhar roupa, comida, questões escolares dos filhos, embora hoje uma parcela crescente de pais tenha entendido que, não sendo nem retardados nem deficientes físicos (ou mesmo sendo), podem assumir e curtir esses pequenos grandes trabalhos.

A mãe da gente é aquela que nos controla e assim nos salva e nos atormenta; e nos aguenta mesmo quando estamos mal-humorados, exigentes e chatos, mas também algumas vezes perde a calma e grita, ou chora. Mãe da gente é aquela que nos oprime e nos alivia por estar ali; que nos cuida, às vezes demais, e se não cuida a gente faz bobagem; é a que se queixa de que lhe damos pouca bola, não ligamos para seus esforços, e, mais tarde, de que quase não a visitamos; é aquela que só dorme quando sabe que a gente está em casa, e chegou bem; a que levanta da cama altas horas para pegar a gente numa festa quando o pai não está ou não existe, ou já fez isso vezes demais.

A mãe da gente é o mais inevitável, inefugível, imprescindível, amável, às vezes exasperante e carente ser que, seja qual for a nossa idade, cultura, país, etnia, classe social ou cultura, nos fará a mais dramática e pungente falta quando um dia nos dermos conta de que já não temos ninguém a quem chamar "mãe".

sábado, 11 de maio de 2013

Canção das mulheres



Que o outro saiba quando estou com medo, e me tome nos braços sem fazer perguntas demais.

Que o outro note quando preciso de silêncio e não vá embora batendo a porta, mas entenda que não o amarei menos porque estou quieta.

Que o outro aceite que me preocupo com ele e não se irrite com minha solicitude, e se ela for excessiva saiba me dizer isso com delicadeza ou bom humor.

Que o outro perceba minha fragilidade e não ria de mim, nem se aproveite disso.

Que se eu faço uma bobagem o outro goste um pouco mais de mim, porque também preciso poder fazer tolices tantas vezes.

Que se estou apenas cansada o outro não pense logo que estou nervosa, ou doente, ou agressiva, nem diga que reclamo demais.

Que o outro sinta quanto me doía ideia da perda, e ouse ficar comigo um pouco - em lugar de voltar logo à sua vida.

Que se estou numa fase ruim o outro seja meu cúmplice, mas sem fazer alarde nem dizendo ''Olha que estou tendo muita paciência com você!''

Que quando sem querer eu digo uma coisa bem inadequada diante de mais pessoas, o outro não me exponha nem me ridicularize.

Que se eventualmente perco a paciência, perco a graça e perco a compostura, o outro ainda assim me ache linda e me admire.

Que o outro não me considere sempre disponível, sempre necessariamente compreensiva, mas me aceite quando não estou podendo ser nada disso.

Que, finalmente, o outro entenda que mesmo se às vezes me esforço, não sou, nem devo ser, a mulher-maravilha, mas apenas uma pessoa: vulnerável e forte, incapaz e gloriosa, assustada e audaciosa - uma mulher.

Lya Luft